É Tudo de Bom. A ideia do voto em branco é ótima
Alcir Santos de Oliveira
Não tem como não gostar. Começa que o mote do enredo é tudo que eu gostaria de ver acontecer um dia no Brasil: enquanto os partidos de direita, meio e esquerda se digladiam pelo poder, o povo resolve tomar rumo diferente, comparece em massa às sessões eleitorais e vota normalmente. Problema é que, das apurações, sai o inesperado: partidos de direita e meio, 8% cada; partido de esquerda 1%; zero de abstenções e de nulos. Problema é que os votos brancos somam 83%. Com isso os políticos adotam a atitude mais absurda que se pode imaginar, decidem abandonar a cidade, sede do governo, levando com eles todo o aparato estatal, inclusive polícia, bombeiros, pessoal de limpeza etc.
A partir daí Saramago mostra o comportamento distorcido, mesquinho e vingativo da classe política, a partir do presidente. Os eleitores não praticaram qualquer infração, afinal o voto em branco é perfeitamente constitucional. Mas os políticos se sentem ofendidos, alegam a existência de um complô arquitetado por algum grupo clandestino e resolvem retaliar. Ou seja, têm o mesmo comportamento doentio, viciado, vingativo e desqualificado que já estamos cansados de observar nessa classe que tem como objetivo maior os próprios interesses e não os da sociedade. Ao decidirem abandonar a capital, decretar estado de sítio e impedir a saída dos cidadãos têm como objetivo o caos, esperam que as pessoas se agridam, que o lixo cubra a cidade e a que os conflitos pessoais passem a ser a constante. Não é o que acontece. As pessoas fazem exatamente o contrário, entram num processo de solidariedade deixando entrever que a existência de um governo, de policiais, forças armadas, não é assim tão importante. Sem conseguir provar a tese do complô, governo, ministro do interior à frente, se vale da carta de um sujeito de baixa extração para buscar, entre alguns personagens de o “Ensaio Sobre a Cegueira”, especialmente a única pessoa que não ficou cega, mulher de um oftalmologista, os organizadores do festival de votos em branco. E assim, no afã de retaliar, ultrapassam princípios comezinhos de cidadania e o final é como um soco no estômago.
Enfim, um livro sensacional e uma aula imperdível mostrando que muito do aparato do estado é, simplesmente dispensável, pois que desnecessário. Mas que a idéia de votar, em massa, no branco é muito atrativa, ah, isso é.......
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