Invenção e memória é uma coletânea de 15 contos inéditos de Lygia Fagundes Telles. A escritora mostra com seus personagens a gama de sentimentos que a chamada vida moderna provoca em cada um de nós. Uma tensão interiorizada permeia o texto, onde conflitos subjetivos são levados no ritmo da observação e da memória. Narradora intimista, com sua linguagem límpida e nervosa ela evoca cenas e estados de espírito da infância e da adolescência, alguns tristes e amargos, outros impregnados de humor sutil e fina ironia. Há, sim, morte, escuridão, solidão e loucura. Mas também bastante romantismo, crítica social e, principalmente, esperança.
Em "Que se chama solidão" e "Suicídio na granja", há o encontro da infância (o alvorecer da vida) com a morte — esse tema onipresente nas obras de Lygia. A adolescência de sonhos e fantasias — e não por acaso a narrativa ganha toques fantásticos — está em "Dança com o anjo", "Que número faz favor?" e "Cinema Gato Preto". Em "Se és capaz" a autora fala de forma amarga e irônica sobre a entrada na idade madura. Já "Heffman" é uma bem-humorada recordação dos tempos de estudante, e "O Cristo da Bahia", "Dia de dizer não" e "O menino e o velho", pungentes crônicas sociais.
Em "Rua Sabará, 400", a escritora faz uma citação a Machado de Assis, lembrando Dom Casmurro. Bem a propósito, pois como contistas os dois escritores têm muito em comum: surpreendem no início da narrativa, na forma original de conduzir a história, nos desfechos surpreendentes, características que persistem em "A chave na porta", "História de passarinho", "Potyra" e "Nada de novo na frente ocidental".
Uma das maiores escritoras brasileiras de todos os tempos, Lygia Fagundes Telles sempre se renova e nos surpreende com sua imaginação prodigiosa, sua linguagem altamente elaborada — que, mesmo assim, brinca o tempo todo com o leitor — e seu riquíssimo universo ficcional.