Para quem gosta de qualidade!
Alcir Santos de Oliveira
Primeiro cabe destacar o trabalho da tradutora, Ana Ban. A despeito da velha, e perene máxima latina de que “traduttore, traditore”, o que se tem aqui é uma tradução arriscada, e feliz, porque ela atingiu a essência da linguagem caipira do sul dos Estados Unidos na década de trinta do século passado, valendo-se, para tanto, do que tinha à mão que é a forma de se expressar dos nossos homens do campo. Feito o registro, até por uma questão de justiça, ao livro propriamente dito.
Eis um autêntico clássico da literatura americana, talvez mundial. Steinbeck, ainda e sempre um dos mais importantes romancistas do século XX, traça nesse pequeno – em tamanho – livro um verdadeiro tratado sobre a amizade, sentimento capaz de se sobrepor até as mais duras condições de vida. Ao fundo, como uma espécie de cenário cru, a dura realidade dos trabalhadores braçais que, em levas, percorriam, sem rumo, ou como diria Caetano Veloso, “sem lenço e sem documento”, trabalhando, hoje aqui, amanhã ali, em troca de pouco mais que a comida e um canto infecto onde descansarem e, se possível dormir, as fazendas, para trabalhar na colheita, fosse de que produto fosse. Aí o lado social do livro, onde escancara a recessão norte-americana, nos campos férteis da Califórnia, já que, de modo geral, só se fala das suas consequências nos centros urbanos.
É nesse cenário de desesperança que o autor coloca seus personagens, Lennie, fisicamente um gigante, quase sem capacidade de se expressar e, pior ainda, de discernir as coisas, podendo, em consequência, praticar os atos mais absurdos já, sequer, sabia mensurar a sua imensa força física. Em contraste, George, seu amigo e companheiro de sempre que contrapunha a sua parca força física uma grande capacidade mental. Assim, os dois se completavam, sendo um o corpo e outro a cabeça, protegendo-se mutuamente. Sem dúvida uma belíssima página sobre a amizade desinteressada de dois homens, a ponto de um chegar a matar o outro como forma de impedir o seu sofrimento em mãos dos seus captores ou da policia. Um livro para não esquecer!
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